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A esquerda pira: ‘Mito, mito, mito…’ Conheça a trajetória de Jair Bolsonaro

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De capitão a presidente: conheça a trajetória de Jair Bolsonaro

Capitão reformado do Exército, deputado federal desde 1991 e dono de uma extensa lista de declarações polêmicas, Jair Messias Bolsonaro materializou em votos o apoio que cultivou e ampliou a partir das redes sociais e em viagens pelo Brasil. Ao catalisar, com um discurso conservador, o sentimento contrário à corrupção, ao PT e ao próprio sistema político, o candidato do PSL foi eleito neste domingo (28), aos 63 anos, presidente da República.

Superou na campanha a estrutura pequena do PSL e a falta de alianças com grandes legendas. Foi criticado por exaltar a ditadura e por suas declarações polêmicas. E sobreviveu a um atentado. Em 6 de setembro, Bolsonaro era carregado nos ombros por seguidores em Juiz de Fora (MG) quando foi agredido por um homem com uma faca que perfurou seu abdômen. Submetido a cirurgias, passou três semanas internado e concentrou a campanha nas redes sociais.

Embora esteja na política há três décadas, ele vendeu a imagem de que não é um político tradicional. Ganhou apoios fora de sua base política, no Rio, e nos diversos estratos da sociedade.

A decisão de ser candidato

Jair Bolsonaro Paulo Guedes no Hospital Albert Einstein, em São Paulo — Foto: Arquivo pessoal

Dias depois da reeleição de Dilma Rousseff (PT) em 2014, o deputado estava na casa onde mora com a família no Rio de Janeiro, sozinho à mesa, quando tomou a decisão de concorrer à Presidência da República.

Ele diz que não havia ninguém a seu lado. “Ninguém. Depois eu levei para minha esposa, foi a segunda pessoa que tomou conhecimento. E depois botamos o plano em funcionamento. Ninguém acreditava.”

“De vez em quando, eu confesso, até eu falava: será que eu estou no caminho certo?”

Para o general Hamilton Mourão (PRTB), agora vice-presidente eleito, Bolsonaro percebeu o recado das urnas em 2014, após a vitória apertada da petista Dilma Rousseff sobre Aécio Neves, do PSDB.

“A eleição passada mostrou que a onda esquerdista estava se esgotando e que as pessoas queriam um novo jeito de fazer política”, relatou o general ao G1.

Ele saltou de 120,6 mil votos em 2010 para 464,5 mil em 2014, sendo o deputado federal mais votado do Rio de Janeiro.

Antes mesmo da eleição, em abril de 2014, ele já havia anunciado da tribuna da Câmara que colocava seu nome à disposição do PP para concorrer à Presidência com a “cara da direita”, mas foi ignorado pela própria legenda, que apoiou a campanha de Dilma.

Àquela época, Bolsonaro já sabia para qual direção queria levar o país. “Eu estou disposto em 2018, seja o que Deus quiser, tentar jogar pra direita esse país”, disse em novembro de 2014 na Academia Militar das Agulhas Negras, em Resende (RJ).

“Qual a cara da direita, que é a minha cara? É a defesa da redução da maioridade penal. É uma política de planejamento familiar. É a defesa da família contra o kit gay. É a revogação do Estatuto do Desarmamento. É o fim da indústria de demarcação de terras indígenas. É o respeito e a valorização das nossas Forças Armadas”, disse Bolsonaro na oportunidade.

“Com ele, não tem politicamente correto. As pessoas podem estranhar, mas enxergam que ele é franco e não tem medo de se posicionar”, afirma o presidente licenciado do PSL Luciano Bivar, que se reelegeu deputado nesta eleição.

‘Mito, mito, mito…’

No fim de 2014, recém-eleito para o sétimo mandato consecutivo, o deputado percorreu o país, realizou carreatas, estampou camisetas e adesivos, posou para “selfies” com eleitores e proferiu palestras. Ganhou um público jovem e ligado nas redes sociais, que o apelidou de “mito” e distribuiu memes com frases do político.

E passou a compartilhar nas redes sociais tudo o que vivia e fazia, cada momento. Como o vídeo de um protesto contra a corrupção em Copacabana, em 15 de março de 2015, em que ouviu de apoiadores: “Um, dos, três, quatro, cinco mil… queremos Bolsonaro presidente do Brasil!”. Ou o registro de uma visita a Belém também em 2015: “Assim, a cada dia, ficamos mais capacitados para dar um voo mais alto”.

No segundo semestre de 2015, foi recebido aos gritos por seus futuros eleitores em aeroportos lotados em Fortaleza (“Bolsonaro, guerreiro, orgulho brasileiro!”), Cuiabá (“Mito, mito, mito…”), João Pessoa (“Olé, olé, olé… mito, mito!”), Manaus, entre outros. A reação o deixou confiante no futuro.

Sobre o apelido de “mito”, Bolsonaro já disse:

“Mito, eu não sei de onde veio isso aí. Até brinquei, deve ser do meu apelido de criança, ‘parmito’”.

O plano presidencial passou a ser revelado em 2015 para colegas, que não levavam a sério a viabilidade da empreitada, já que a polarização entre PT e PSDB parecia sólida. O general Mourão foi procurado à época.

“Lá por 2015 ele disse que poderia precisar de mim em algum momento, pois queria um vice de absoluta confiança. Fiquei paradinho”, contou o general, que foi para a reserva do Exército em 2018 e virou o vice da chapa de Bolsonaro após a desistência de outros nomes.

Ciente de que seria deixado de lado pelo PP outra vez, Bolsonaro migrou para o PSC e, finalmente, chegou ao PSL, partido que teve apenas um deputado eleito em 2014 e, em 2018, , conseguiu eleger uma bancada com 52 deputados.

Infância no interior paulista

O deputado que falava sozinho | VEJA

Eleito sete vezes deputado federal pelo Rio de Janeiro, Jair Bolsonaro cresceu no interior de São Paulo. Um dos seis filhos do casal Percy Geraldo e Olinda, nasceu em 21 de março de 1955, na cidade de Glicério, que tem pouco mais de 4 mil habitantes, mas foi registrado em Campinas.

A devoção da mãe pela religião e a paixão do pai por futebol acabaram dando o nome de batismo do novo presidente do Brasil: Jair Messias Bolsonaro.

“Nasci em 1955, minha querida mãe ainda está viva. Uma gestação bastante complicada, ela como católica, botou o nome em mim, botou um dos meus nomes de Messias. Mas não sou o salvador da pátria. Quem vai salvar essa pátria somos nós. O Jair veio porque, naquele dia, 21 de março, era aniversário do Jair Rosa Pinto, meia-esquerda da seleção brasileira e do Palmeiras. E o meu pai, como palmeirense, botou o nome em mim de Jair.”

Dentista prático, o pai do futuro presidente passou com a mulher e os filhos por várias cidades até se fixar em Eldorado, município onde a família ainda vive, distante cerca de 250 km de São Paulo. Percy faleceu na década de 1990.

Em entrevista à revista “Crescer”, em 2015, Olinda relatou que o filho era um rapaz “humilde”, “manso” e “reservado”, que não era dado a “falar besteira”. O garoto magro e de olhos azuis viveu na pacata cidade do Vale do Ribeira entre estudos, jogos de futebol e pescarias.

Em Eldorado, quando tinha 15 anos, Bolsonaro conta que ajudou soldados do Exército que precisavam encontrar os melhores caminhos pela mata. Eles estavam à procura do guerrilheiro Carlos Lamarca, um dos líderes da luta armada de esquerda no Brasil nos anos 70.

“Eu andava naquela região toda, eu extraía palmito nativo do mato. Morei muito tempo numa fazenda de nome Kirongozi. Então, essa conversa de característica da mata passou muito por mim conversando com o pessoal do Exército que estava acampado lá”, disse.

Carreira no Exército

Fotos: Eldorado, uma visita às origens de Bolsonaro | | EL PAÍS

Decidido a entrar para o Exército, Bolsonaro trocou São Paulo pelo Rio de Janeiro. Concluiu em 1977 o curso da Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), em Resende (RJ).

Com aptidão para esportes, como o atletismo, fez o curso da Escola de Educação Física do Exército.

Contemporâneo de Bolsonaro, o deputado Alberto Fraga, policial militar, relembra a amizade que começou durante o curso e se manteve ao longo dos anos quando se reencontraram na Câmara dos Deputados.

Fraga conta que Bolsonaro era um “baita de um corredor” e se destacava no pentatlo militar, modalidade esportiva que inclui corrida, tiro com rifle e lançamento de granada (não explosiva), o que rendeu a ele o apelido de “Cavalo” ou “Cavalão”.

O amigo o descreve como uma pessoa “correta” e preocupada com os demais, que “brigava com os colegas do Exército para defender os policiais militares” que também faziam o curso.

“Teve um episódio interessante. Na travessia marítima Flamengo-Urca, eu vinha nadando junto com ele, e um colega teve cãibra de abdômen no meio da travessia. Eu o vi gritando e nadei até perto dele, o Bolsonaro também chegou e o ajudamos até chegar o barco [para tirá-lo da água]. Ele sempre foi um bom parceiro”, conta Fraga sobre a tradicional prova que marca o término do curso.

Depois, Bolsonaro fez cursos de salto na Brigada Paraquedista do Rio e de mergulho autônomo no Corpo de Bombeiros do Rio.

Reclamação sobre soldo e eleição para vereador

A história e as principais ideias do presidente Jair Bolsonaro - DHoje  Interior

No Exército, Bolsonaro chegou ao posto de capitão. Segundo o general Hamilton Mourão, com quem conviveu quando estava na ativa, Bolsonaro demonstrava “coragem moral” para sustentar opiniões e era “determinado”.

Em 1986, ficou preso por 15 dias depois de escrever um artigo na revista “Veja” reivindicando aumento de salário para os militares.https://tpc.googlesyndication.com/safeframe/1-0-37/html/container.html

“Sou um cidadão brasileiro cumpridor dos meus deveres, patriota e portador de uma excelente folha de serviços. Apesar disso, não consigo sonhar com as necessidades mínimas que uma pessoa do meu nível cultural e social poderia almejar”, escreveu Bolsonaro.

O texto rendeu 15 dias de prisão ao militar por indisciplina, conforme o jornal “O Globo”.

Em 1987, a revista publicou que Bolsonaro e outro militar planejavam explodir bombas pra pressionar o comando do exército a reajustar salários. Bolsonaro negou as acusações da revista. O caso chegou ao Superior Tribunal Militar e o capitão foi absolvido.

No mesmo ano do julgamento, Jair Bolsonaro decidiu trocar a farda pelo paletó e gravata. Foi eleito vereador no Rio de Janeiro e, por isso, foi para a reserva no Exército.

No Parlamento

O deputado que falava sozinho | VEJA

A trajetória de Jair Bolsonaro como vereador foi curta. Em 1990, dois anos depois de eleito, o militar da reserva conquistou o primeiro dos sete mandatos consecutivos de deputado federal – no período, passou pelos partidos PDC, PPR, PPB, PTB, PFL, PP, PSC e PSL.

Bolsonaro tomou posse em 1991 na Câmara dos Deputados. Da tribuna, criticou presidentes pelo tratamento conferido às Forças Armadas, cobrou reajustes salariais, ressaltou feitos da ditadura militar e defendeu o controle de natalidade como forma de combater a miséria.

Bolsonaro ainda foi um dos principais críticos de um projeto voltado ao público adolescente que o Ministério da Educação estudava adotar nas escolas para discutir a diversidade e combater a homofobia.

“A relação entre um homem e uma mulher já não é mais normal. Aonde vamos parar?”, reclamou em 2011.

De tempos em tempos, a língua afiada e as atitudes do parlamentar renderam representações no Conselho de Ética da Câmara ou ações na Justiça. Ele foi alvo de quatro processos desde a instalação do conselho.https://tpc.googlesyndication.com/safeframe/1-0-37/html/container.html

Um dos embates mais emblemáticos ao longo da sua trajetória na Câmara foi com a deputada Maria do Rosário (PT-RS). Em 2014, Bolsonaro repetiu da tribuna ofensas contra a parlamentar dizendo que só não a estuprava porque ela “não merecia”.

Ele foi condenado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) a pagar uma indenização por danos morais. Bolsonaro também é réu no Supremo Tribunal Federal (STF) por apologia ao crime de estupro e injúria.

Como deputado, Bolsonaro votou a favor dos impeachments dos presidentes Fernando Collor (1992) e Dilma Rousseff (2016) e pelo prosseguimento das duas denúncias apresentadas pela Procuradoria Geral da República (PGR) contra o atual presidente Michel Temer (2017).

Na gestão de Temer, o parlamentar votou a favor da reforma trabalhista e da emenda que estabeleceu o teto de gastos. No passado, segundo reportagem do jornal “O Globo”, não teve o perfil liberal que propagou na campanha: votou contra o Plano Real, contra a quebra dos monopólios do petróleo e das telecomunicações e contra as reformas administrativa e da Previdência.

Bolsonaro tentou por quatro vezes presidir a Câmara. Não conseguiu. Durante a vida parlamentar, aprovou dois projetos que viraram lei:

  • Projeto que estendia o prazo para isenção do Imposto sobre Produto Industrializado (IPI) para bens de informática;
  • Projeto que autorizava o uso da fosfoetanolamina, a “pílula do câncer”, cuja pesquisa foi suspensa por não ter eficácia comprovada em testes.

Polêmicas e explicações

Política em família - ISTOÉ Independente

Analistas políticos, adversários e mesmo aliados duvidavam que o deputado com 28 anos de Congresso pudesse chegar ao Palácio do Planalto.

“Ele tinha me dito: ‘Olha, este é o meu último mandato aqui. Eu não quero mais, eu vou disputar a Presidência da República’. E eu disse: ‘Rapaz, tenta o Senado, o Senado é o melhor quadro para você. Você se elege tranquilamente’. Ainda brinquei com ele: ‘Você sabe que nós somos pessoas polêmicas’”, relembra o deputado federal Alberto Fraga (DEM-DF), que conhece Bolsonaro desde os anos 70.https://tpc.googlesyndication.com/safeframe/1-0-37/html/container.html

Sobre as polêmicas, o amigo estava certo. Bolsonaro era mais conhecido pelas declarações que deu. Criou polêmica:

  • Com homossexuais: “Prefiro que um filho meu morra num acidente do que apareça com um bigodudo por aí. Para mim ele vai ter morrido mesmo” (Revista “Playboy”);
  • Ao negar a ditadura militar: “E nós passamos, sr. presidente, 20 anos de período, não de ditadura, mas de um regime com autoridade, em que o Brasil cresceu, tivemos pleno emprego, respeito aos direitos humanos – porque hoje em dia a violência está aí fora –, segurança, amor à pátria e democracia. E mais ainda, nenhum presidente militar ou militar enriqueceu, respondeu a qualquer processo por corrupção” (em 20/11/2013);
  • Ao homenagear durante o impeachment de Dilma Rousseff o ex-coronel Brilhante Ustra, o primeiro militar condenado pela Justiça brasileira por tortura durante a ditadura militar: “Pela memória do Coronel Carlos Brilhante Ustra, o pavor de Dilma Rousseff!” (ao votar em 17/04/2016).

Na campanha, foi explicando as polêmicas.

Em entrevista ao Jornal Nacional, cobrado, pediu desculpas pela frase sobre preferir um filho morto a um filho gay: “Não, tem muito gay que é pai, que é mãe, e concorda comigo. As declarações foram fortes, foram algumas caneladas. Peço até desculpas, mas foi um momento de temperatura alta em comissões, que quase houve vias de fato em muitas discussões, porque o ativismo LGBT levava para isso” (JN, 28/09/2018).

Também condenou quem quer dividir o Brasil entre homos e héteros: “Nenhum país do mundo tem o que nós temos: riquezas minerais, biodiversidade, água potável, regiões turísticas. Temos tudo, tudo para ser uma grande nação. Para isso, temos que unir o nosso povo. Unir os cacos que nos fez o governo da esquerda no passado, botando de um lado negros e brancos, jogando nordestinos contra sulistas, jogando pais contra filhos, até mesmo quem tem opção sexual, homo contra héteros” (em pronunciamento após a vitória no 1º turno, em 07/10).https://tpc.googlesyndication.com/safeframe/1-0-37/html/container.html

Disse que nada tem contra os gays: “Nada contra os homossexuais. Cada qual vai ser feliz da maneira que bem entender, mas querer impor nas escolas precocemente que as crianças despertem para o sexo, não, Haddad” (em entrevista, 11/10).

E também no Jornal Nacional, em 8 de outubro, defendeu a democracia e a Constituição brasileiras: “Estamos disputando as eleições porque nós acreditamos no voto popular, e seremos escravos da nossa Constituição”.

primeira dama do Brasil a partir de 1º de janeiro, Michele Bolsonaro, refuta a imagem que os adversários fizeram do presidente eleito. “Ele não é nada disso. Ele é tachado, ele não é essa pessoa que falam. Eu sou prova disso. Quem convive conosco também. Então, assim, é uma infelicidade de quem fala que ele é racista, machista, homofóbico, é tudo mentira.”

“Como ele é em casa?”, perguntou um repórter. “Um príncipe. Um maridão.”

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