Quem é o “Zero Seis”, o secretário que revolucionou a pesca no Brasil
No auge da crise ambiental que assolava as praias, Jorge Seif Júnior teve uma grande oportunidade de demonstrar aos brasileiros para que serve, afinal, o departamento do governo que está aos seus cuidados, a Secretaria de Aquicultura e Pesca.
Em vez de discutir seriamente medidas que podem ser tomadas para minimizar os estragos provocados pelo vazamento de combustível na vida marinha, acabou engrossando o folclore com uma declaração digna de um bagre político.
“O peixe é um bicho inteligente e, quando vê a manta de óleo, foge porque tem medo”, disse ele, durante uma live com o presidente Bolsonaro transmitida em 31 de outubro, jogando sobre as escamas de anchovas, tainhas, “trairas”e manjubas, entre outras espécies, a responsabilidade de se desviar do problema.
Suas palavras inspiraram memes na internet e uma reação do Ministério Público Federal em Sergipe, que questionou o secretário sobre quais estudos o levaram a afirmar que os pescados estariam aptos para o consumo. Convicto de sua crença, Seif Júnior foi um dia depois às redes sociais para rebater as críticas recebidas. Em tom irônico, perguntou a seus seguidores se havia “algum registro de cardumes suicidas se jogando para dentro da mancha de óleo”. Na sequência, o presidente saiu em defesa de seu subordinado garantindo que a vida no mar tem, sim, inteligência. “Se o peixe não se desviasse, as manchas de óleo estariam matando peixe 24 horas por dia”, resumiu Bolsonaro.
Antes da polêmica sobre o poder dos neurônios dos seres aquáticos, Seif Júnior já chamava atenção pela frequência de sua presença nas lives presidenciais. Com oito aparições, tornou-se o campeão nesse quesito, à frente de ministros como o general Augusto Heleno, Tarcísio de Freitas e Ernesto Araújo. O secretário já utilizou o espaço para dizer que havia enviado ofício aos governadores pedindo a adoção do filé de pescado na merenda escolar e divulgou ali o evento “Tambaqui na Esplanada”. O negócio foi realizado em 7 de agosto na Esplanada dos Ministérios, com a ajuda de parceiros da secretaria que se mobilizaram para comprar grelhas, arrumar carvão e pagar o aluguel do caminhão que trouxe o carregamento de 6 toneladas de tambaqui para aproximadamente 5 000 pessoas
Seif Júnior virou tão “peixe” de Bolsonaro que o presidente passou a tratá-lo como filho adotivo, chamando-o de Zero Seis. Antes de entrar para o governo, ele trabalhava na JS Pescados, uma empresa familiar especializada na pesca de sardinhas e atuns. O fundador do negócio e pai do secretário ganhou prestígio entre os bolsonaristas na campanha ao postar alguns vídeos de apoio. O capitão ficou tão grato que resolveu conhecê-lo pessoalmente no fim do ano passado. Seif Júnior foi junto, levando uma lista de reivindicações e sugestões do setor da pesca. O presidente gostou da conversa e, em seu estilo bate-pronto, disse que Jorge cuidaria “disso daí para ele” e, na semana seguinte, a convite da ministra da Agricultura, Tereza Cristina, a quem a Secretaria da Aquicultura é subordinada, Seif Júnior já integrava o gabinete de transição.
Entre suas maiores realizações à frente desse departamento até agora, ele destaca o recadastramento dos registrados no seguro-defeso, benefício pago a pescadores profissionais impossibilitados de desenvolver suas atividades durante o período de reprodução das espécies. “Havia quase 70% de registros fraudados, uma vergonha nacional”, diz. No último dia 12, pescadores fizeram uma manifestação no centro do Recife, em Pernambuco, para reclamar do atraso na liberação de uma parcela extra do benefício aos trabalhadores devido aos prejuízos gerados pelo vazamento do óleo. “Estamos acompanhando, com a ajuda de pesquisadores, a extensão do problema e, até o momento, nenhum tipo de contágio foi constatado”, afirma Seif Júnior. Recentemente, ele pediu à ministra Tereza Cristina a edição de uma medida provisória para disponibilizar o seguro-defeso também para marisqueiros e catadores de caranguejos do mangue. A julgar pelo pedido, nem o próprio secretário acredita muito na história de cardumes inteligentes capazes de se desviar do óleo. Em tempo: segundo Francisco Kelmo, biólogo da Universidade Federal da Bahia, ainda que tivessem o cérebro de Albert Einstein, os seres do mar não conseguiriam evitar o contato com o combustível, pois suas partículas podem ser inaladas na respiração debaixo d’água. A sabedoria popular já atestava o mesmo: peixe morre pela boca.